A Literatura serve de ótimo embasamento para sabermos a quantas andava a infância no Século XIX. Um exemplo é o romance Germinal, De Emile Zola, romance naturalista que narra as agruras enfrentadas pelos mineiros de uma cidade no norte da França. Nessa narrativa temos a família dos Maheu, na figura do pai, da filha e dos irmão maiores enfrentando um calor de 35º no fundo uma mina onde o ar não circula. Os filhos menores juntamente com a mãe visitam as casas dos burgueses, donos da mina, para mendigarem as migalhas que lhes caem da mesa. Enquanto isso, os filhos da burguesia acordam às oito horas (aqui fizemos a adaptação de horário), para encontrar uma mesa repleta de deliciosas guloseimas, além dos carinhos materno e paterno e, em seguida, terem as aulas quer os educarão para manterem o “status quo”.
No romance o Ateneu, já analisado aqui quando estudamos a Interpretação dos sonhos, temos Sérgio, pequeno burguês que, após sair dos aprendizados iniciais, vai estudar numa escola grande, o internato chamado Ateneu, dirigido pelo histriônico Aristarco. Ao chegar à escola seu pai lhe diz que ele vai conhecer o mundo. O diretor da escola por sua vez ordena-lhe que vá ao cabeleireiro deitar fora as longas mechas. Ao que sua esposa diz ao garoto que presenteie sua mãe, pois são elas, as mechas, a única lembrança que as crianças deixam à genitora. Naquele momento, aos onze anos, Sérgio dá adeus à infância. Mesmo esse pequenino burguês terá que se tornar adulto antes do tempo previsto para hoje, época em que o ciclo infantil dura um pouco mais, devido ao fato de haver um mercado grande voltado para a infância.
Outro romance que nos mostra como era a ausência de infância para aqueles que não pertenciam sequer à classe proletária, pois estão a bons graus abaixo disso, é O Cortiço, do maranhense Aloísio Azevedo. Nesse romance, também de cunho naturalista, é narrada a saga de João Romão para se tornar um capitalista. As primeiras palavras do romance indicam que “dos treze aos vinte e cinco anos” ele foi empregado de um vendeiro. Indo embora, o patrão lhe deixou a venda e alguns trocados. Juntados esse dote aos de uma negra ajornalada, Bertoleza, com a vida desta, João Romão em breve era dono de um cortiço no bairro de Botafogo. Imaginemos que nesse aglomerado de casinhas havia toda sorte de gente, honesta, mas muito pobre. Eram em sua maioria vendedores ambulantes, chamados de mascates, lavadeiras berradeiras sem nenhuma educação. Eram seres sem nenhuma privacidade, vivendo como vivem os insetos e os animais rasteiros. As crianças, neste contexto, estão sempre encarregadas de algum trabalho. Na página 22 temos a seguinte fala: “Um rapazito de paletó entrou da rua e foi perguntar à Machona pela Nhá Rita”. Esse “rapazito” nada mais é do que um ser que poderia ser uma criança. Sabemos disso pela sequência, quando, ao se afastar, a Machona o orienta que vá a venda do Romão pedir informações sobre a Rita e o chama de “filho” e “pequeno”. Na sequência da narrativa, aparece Agostinho, filho da Leandra, a Machona, e esta pergunta por que ele não foi regar a horta do comendador.
Voltando ao documentário A Invenção da Infância, de 2000, vemos que a história se mantém inalterada. Filhos de pessoas abastadas, sejam ricas ou classe média alta, são crianças, tem o desenvolvimento de uma criança. Estudam em grandes escolas, aprendem balé, natação, jogam vídeo games. Os filhos do “cortiço” estudam em escolas deficitárias e trabalham para ajudar em casa, ganhando uma quantia irrisória. São crianças de cabeça baixa, cujos traumas ajudarão na construção de um adulto cabisbaixo, tímido. Conforme a última frase do documentário “Ser criança não significa ter infância”.
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